Com as mudanças que vêm sacudindo o cenário da publicidade e do marketing vários modelos e conceitos têm passado por releituras. Por um lado é necessário e inevitável, mas por outro, a tendência atual em padronizar tudo, tem transformando em commodities o que antes era algo especializado. Muitos conceitos importantes no universo do marketing agora viraram uma espécie de receita de bolo, um remédio para todas as doenças, sendo amplamente difundidos pelas Redes Sociais.

As plataformas, que vieram para facilitar a vida das empresas, também trouxeram a falsa ideia de que tudo pode ser produzido em escala, e que não é necessário ser especialista em coisa alguma.

Ao mesmo tempo que estas mudanças facilitaram o acesso de pequenos e micro empreendedores em busca de mais resultados – aderindo ao “faça você mesmo”, algo exaustivamente vendido pelos novos “gurus digitais”- ; também desvalorizaram o trabalho de agências e profissionais especializados, que passaram muitas vezes a competir por preço e não mais por valor. (Quem quiser se aprofundar neste assunto, tem um artigo que escrevi aqui.).

Entretanto, nesta onda de padronização e comoditização geral, nenhum modelo foi tão empacotado como a “Jornada do Consumidor”. Mas embora seja um conceito antigo e usado como base real para entender o processo de compra, ele está longe de ser um modelo universal e padronizado como tem sido vendido para todo e qualquer mercado.

OS VÁRIOS CAMINHOS PERCORRIDOS PELO CONSUMIDOR

Para entender os resultados de mercado o conceito de jornada de compra é muito útil e nos serve como base para acompanharmos os estágios do consumidor de nenhuma consciência em relação a um produto ou serviço até a alta consciência, o interesse, a compra, a recompensa e a propaganda espontânea.

Porém, na vida real, os consumidores vão percorrer caminhos bem complexos e heterogêneos envolvendo diferentes combinações de mídias tradicionais e digitais, sendo que cada mercado no qual cada marca atua tem suas próprias peculiaridades. Isso vai influenciar o grau de complexidade de cada percurso. Por exemplo: setores que têm como característica um baixo risco de compra, ou seja, preços baixos e alta frequência de compra, costumam ter uma jornada bem mais simples e curta do que segmentos onde existam muitas dúvidas a respeito do produto ou serviço, preços altos e demandem mais envolvimento do consumidor. Estes setores possuem uma jornada mais longa e complexa, e que pode ainda variar segundo diferentes mercados geográficos para uma mesma marca.

O MODELO DOS 5 AS (veja o gráfico ilustrativo ao final)

Para ilustrar os diferentes tipos de caminhos percorridos, foi criado um modelo genérico baseado em 5 estágios que chamamos de 5AS, que são: 1. Atenção (quando o consumidor é impactado), 2. Assimilação (quando ele se sente atraído pela oferta), 3. Arguição (quando ele tem curiosidade para saber mais), 4. Ação (quando ele decide pela compra) e 5. Apologia (quando ele passa a defender e recomendar a marca). Este modelo, proposto por Philip Kotler e Herman Kartajaya, duas das maiores autoridades mundiais no assunto, serve para todos os setores porque não é estático, e cada A vai variar conforme o contexto de cada setor. Ele possibilita obter padrões que definem vários arquétipos de setores-chave. Isso é particularmente útil em uma época de convergência tecnológica onde muitos setores acabam se confundindo. A partir daí podemos descobrir como enfrentar os desafios de cada setor.

O mais interessante no modelo proposto por Kotler é que ele nos ajuda principalmente a avaliar taxas de conversão essenciais em um tipo de setor como: o nível de atração com a marca, a curiosidade sobre o produto ou serviço, o compromisso com a marca e o grau de afinidade. Isso tudo nos dá um panorama bem específico sobre um determinado setor.

Padrão 1: Maçaneta

Este é o padrão mais comum do mercado, onde o alto compromisso (assimilação > ação) do consumidor é a principal característica. É o padrão típico do setor de bens de consumo embalados (refrigerantes, comestíveis, itens de higiene, etc.), onde o consumidor tem preferência pelo produto em si mas pouco apego a marcas, e por isso não faz arguições (curiosidade).

Aqui vemos um branding e uma comunicação de marketing bastante agressivos, mesmo porque, como os preços são baixos e a compra é recorrente, milhares de marcas disputam o mesmo consumidor investindo em promoções tentadoras e engajamentos fortes. Interessante observar que este consumidor pode mudar de uma marca para outra muito facilmente caso a marca que ele costuma comprar não esteja no ponto de venda na hora da compra, ou seja, disponibilidade e preço são fatores fundamentais neste setor.

Padrão 2: Peixe

No padrão Peixe, bem diferente do padrão Maçaneta, o consumidor apresenta um alto nível de curiosidade e necessidade de informação (passos 2 e 3, arguição > atração) sobre que está interessado em comprar. Ele foi impactado fortemente, mas ainda tem dúvidas sobre o serviço ou produto. Este caminho é o modelo típico trilhado nas vendas entre empresas (B2B). Aqui há uma alta necessidade por mais informações. Empresas de software (SaS), TI, serviços corporativos e agências de marketing são bons exemplos deste setor.

Nesta categoria o consumidor dedica muito tempo para conhecer mais sobre o serviço/produto, busca interagir com os concorrentes, pesquisa informações e avalia riscos e diversos fatores antes de se decidir, o que torna a jornada mais longa e mais complexa. As empresas deste setor geralmente têm grande dificuldade em vencer estas barreiras pois, como se vêem presas a ofertas commodities e como a publicidade paga nestes setores tem pouco ou nenhum efeito de persuasão, o poder de atração acaba ficando muito baixo ou quase nulo.

Apesar de ser um padrão típico B2B, ele também é encontrado em segmentos B2C que possuem ciclo de venda complexo, onde o consumidor final precisa avaliar riscos e sanar dúvidas antes de partir para a ação. Setores como o imobiliário, educação, financeiro e turismo enfrentam estes mesmos desafios.

Neste padrão o envolvimento com o cliente é parte fundamental no processo de compra.

Padrão 3: Trompete

O padrão Trompete é o modelo encontrado principalmente em categorias de estilos de vida, como relógios sofisticados, carros de luxo, motos poderosas, roupas e bolsas de grife, mas também smartphones e computadores. A principal característica dos consumidores deste padrão, é a alta afinidade com a marca. São consumidores que confiam em certas marcas e estão dispostos a defendê-las, ainda que não as comprem. Por isso é um setor que acaba tendo mais advogados das marcas do que compradores (apologia > ação).

As marcas que brigam pelos consumidores desta categoria já possuem suas reputações e propostas de valor bastante sólidas, principalmente através do boca a boca e construídas ao longo do tempo. A qualidade daquilo que oferecem é indiscutível para quem é atraído por elas e é muito corriqueiro que grupos sejam criados para falar da marca, o que influencia compradores potenciais a descobrir mais sobre as elas.

A categoria Trompete é uma categoria de nicho, pois devido ao alto preço de seus produtos nem todos podem comprá-los, mas mesmo assim tornam-se fãs e entusiastas que recomendam estas marcas, fortalecendo assim a propaganda espontânea. Os canais de venda geralmente são poucos justamente porque a escassez aumenta o interesse de compradores potenciais. Bons exemplos são marcas como Apple, Harley Davidson, Loui Vuitton, Ferrari, Rolex, Armani, BMW, Prada, e tantas outras.

Padrão 4: Funil

O padrão Funil é o mais tradicional de todos, onde a compra é bem planejada e o consumidor está altamente envolvido na decisão de compra, passando por todos os estágios do caminho. O consumidor deste setor faz perguntas sobre aquele serviço ou produto que está sendo ofertado, mas só vai partir para a compra (ação) se o que ouviu em conversas, Redes Sociais e conteúdos variados convencê-lo. Quando isso acontece, ele compra o produto/serviço, experimenta e o recomenda. Este padrão é comum no setor de bens de consumo duráveis e também no setor de serviços, mas o consumidor só passa de um estágio para o outro se realmente estiver convencido através da experiência. Por essa mesma razão podem descartar certas marcas em qualquer momento da jornada.

No processo do Funil o passo A4, ação, é o ponto mais importante para o consumidor, pois ele tem uma elevada expectativa de experiência com a marca, muito diferente do consumidor do padrão 1, que é totalmente superficial. Para que marcas pertencentes a esta categoria aumentem sua performance é importante que seus pontos de contato sejam muito bem gerenciados permitindo assim vários níveis de experiência.

No entanto, um consumidor do tipo Funil pode trocar de marca no momento em que perceber que sua experiência com a marca perdeu qualidade ou deixou de ser interessante. Por isso inovações disruptivas e melhorias graduais são sempre necessárias nesta categoria, porque otimizam a experiência do cliente e o fidelizam. Produtos como geladeiras, fogões, eletrodomésticos em geral, carros populares e serviços como operadoras de TV a cabo, telefonia e internet são bons exemplos deste setor.

 

EXISTE UM MODELO DE CAMINHO IDEAL?

Como colocado acima, podemos perceber que todos os padrões possuem pontos altos e baixos. Entretanto se juntarmos todos os pontos altos dos 4 padrões teremos um padrão no formato gravata borboleta, que seria o padrão de uma marca perfeitamente posicionada, que todos os setores devem almejar.

Neste modelo os consumidores estão conscientes de uma marca e se predispõem a recomendá-la por causa de sua reputação. Além disso, como a atração é muito poderosa, todos que se sentem atraídos por ela acabam comprando sem a necessidade de pesquisar, o que revela um nível de curiosidade na medida certa e um excelente posicionamento.

COMO OS 4 PADRÕES PODEM MELHORAR SEUS PONTOS FRACOS E SE APROXIMAR DO PADRÃO GRAVATA BORBOLETA?

Marcas do padrão Maçaneta podem melhorar a AFINIDADE do consumidor investindo mais em programas de pós-venda, o que hoje é um grande desafio para a maior parte dos bens de consumo embalados. SACs em Redes Sociais são canais perfeitos para isso.

Marcas do padrão Trompete podem aumentar o nível de COMPROMISSO reduzindo o preço e aumentando os canais de disponibilidade, como por exemplo possibilitando experiências reais acessíveis a mais pessoas.

Marcas com padrão Funil devem melhorar seus níveis de COMPROMISSO E AFINIDADE, trazendo um diferencial competitivo em um mercado que enfrenta um enorme desequilíbrio entre as vendas e o pós-venda. Investir em melhorias e inovações disruptivas na experiência do consumidor e gerenciar os pontos de contato – como a publicidade (assimilação), site, blog e central de atendimento (arguição), canal de vendas (ação) e pós-venda (apologia) – são caminhos bastante assertivos.

Finalmente marcas com caminho do padrão Peixe, que são as que enfrentam as maiores dificuldades para se destacar da concorrência, devem melhorar seus níveis de AFINIDADECOMPROMISSO CURIOSIDADE. Isso só é possível investindo em ações que envolvam promoção de conteúdo relevante para otimizar o nível de curiosidade e ações de pós-venda para melhorar os níveis de compromisso e afinidade. Empresas B2B sabem que lidam com consumidores que sabem das coisas.


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Concluindo

Em uma época de comoditização, plataformas e padronizações, sempre é importante lembrar que um tipo de estratégia utilizada para determinado tipo de produto ou serviço raramente funciona para outro. Cada negócio e cada mercado traz em si uma lista de particularidades que vão exigir análise profunda e contextualizada para que qualquer tipo de estratégia faça algum sentido.